sábado, 16 de fevereiro de 2008

Mais do Mesmo


Por Josias de Souza.





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CPI encontrará ‘falhas’ também nas contas de FHC



TCU já mencionava ‘falta de transparência’ em 2002
Auditoria pôs em dúvida contas das viagens de FHC

Presidência fracionou despesas para fugir à licitação
Algumas compras não têm comprovante de quitação
Adquiriam-se de comida a utensílios para o Alvorada
Assessora de ministro viajou até em fins de semana



Há três dias, em carta endereçada ao presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), Fernando Henrique Cardoso informou que não receia que CPI dos Cartões, ainda por instalar, remexa a contabilidade do Planalto relativa à sua gestão. Informou que nem ele nem seus familiares usaram verbas públicas em gastos pessoais. A certa altura, FHC deixou entreaberta uma janela para futuras explicações.

“Quanto aos gastos normais da máquina pública, inclusive no que diz respeito aos incorridos na manutenção dos palácios, nunca foram objeto de determinações específicas nossas”, anotou o ex-presidente. “Se, eventualmente, não seguiram as regras e trâmites normais, é bom que isso seja identificado e esclarecido, para que os erros não se repitam.”

De fato, nem sempre os gastos da presidência tucana ocorreram dentro dos estritos limites das regras e das normas oficiais. Auditoria realizada pelo TCU na Secretaria de Administração da Casa Civil detectou inúmeras “falhas” na escrituração das contas do setor de “suprimento de fundos.” O trabalho, cuja íntegra pode ser lida aqui, perscrutou despesas realizadas entre janeiro e agosto de 2001.

Eis alguns dos achados dos auditores:

Viagens presidenciais: foram analisadas as prestações de contas de oito funcionários destacados para organizar viagens nacionais de FHC. Referem-se a hospedagens e aluguel de carros. Somam, em valores da época, R$ 890,2 mil. A maioria dos processos padece de falta de transparência. Muitos não contêm nem os nomes dos integrantes das comitivas nem a mínima justificativa dos dispêndios. Algo que, para os auditores, “dificulta o processo de controle” e afeta “a transparência dos gastos”. Há notas com “data anterior ao início do período da aplicação” da verba. Uma das prestações de contas –R$ 202 mil— contém despesas “estranhas à viagem presidencial”. Outras duas –R$ 90 mil e R$ 76,2 mil— dão como liquidadas notas que não trazem “comprovação de recebimento por parte da empresa, seja por meio de emissão de recibo” ou pela “identificação do recebedor”. Para os auditores, não se trata “apenas de falha formal”. Pode ser indício de “algum tipo de fraude.”

Fracionamento de despesas: no período esquadrinhado pelo TCU, o Planalto liberou, a conta gotas, R$ 34 mil para a compra de material elétrico e eletrônico. Foram 14 operações. Variaram de R$ 1.000 a R$ 4.000. “Em todos os processos”, anota o relatório do TCU, “foram efetuadas compras de materiais de consumo de mesma natureza, em geral no mesmo conjunto de empresas.” As aquisições ocorreram “em datas muito próximas ou até no mesmo dia.” Um artifício, concluíram os auditores, que possibilitou “a fuga ao devido procedimento licitatório.”

Palácio da Alvorada: A exemplo do que ocorre sob Lula, também na era de FHC parte das verbas destinadas a gastos excepcionais socorreram a residência oficial do presidente. A auditoria alcançou um processo de R$ 20 mil. “Abrangem despesas diversas, desde itens de alimentação e utensílios de cozinha até projeto de arquitetura para a construção de uma guarita.” Nada de aparência irregular.

Segurança da Família: o TCU solicitou ao Planalto explicações para gastos de hospedagem do sargento do Exército João Batista Leal, em Goiânia, e da policial militar Sônia Valéria de Faria, em São Paulo. Em resposta, a presidência informou que estavam em missão oficial do Gabinete de Segurança Institucional. Haviam sido destacados para cuidar da “segurança pessoal dos familiares do vice-presidente [Marco Maciel] e do presidente [FHC].” Exatamente como se faz agora, sob Lula.

Viagens de servidores: os auditores do TCU analisaram um lote de viagens de funcionários do Planalto. No Brasil e no exterior. Encontraram várias “tapiocas”. Há, por exemplo, diárias pagas em excesso, prestações de contas apresentadas fora do prazo e custeio de passagem e hospedagem para pessoa que ainda não fora contratada pelo governo na época da viagem. Chama a atenção, de resto, a compra de passagens aéreas de final de semana para funcionários que se deslocavam para os seus Estados de origem, sem atribuição específica a desempenhar. Renata Zacarelli Lopes, por exemplo, viajava semanalmente de Brasília para São Paulo. Sua missão era "assessorar o ministro Andrea Matarazzo (Secretaria de Comunicação Social)", seu chefe. Em compromissos que invariavelmente "envolviam o final de semana". Os auditores recomendaram a devolução do dinheiro. Mas os ministros que integram o plenário do TCU rejeitaram a sugestão.

O relatório dos auditores foi levado ao plenário do tribunal em 29 de maio de 2002. Os ministros de então leram o documento com olhos condescendentes. As “falhas” foram classificadas como “formais”, sem “má-fé”. Decidiu-se apenas enviar ao Planalto um lote de “recomendações”. Entre elas a de que a presidência se dignasse a dar “maior transparência às prestações de contas dos gastos com viagens presidenciais.”

Ainda não havia à época da auditoria os famosos cartões de crédito corporativos. Foram criados em setembro de 2001, um mês depois do término da pesquisa dos auditores do TCU. Naquele ano, houve um único gasto com cartão. Coisa mixuruca: R$ 90,00. O dinheiro saiu na forma de um saque realizado no caixa eletrônico. Não se sabe o que pagou.

Naquela ocasião, as “pequenas despesas” da administração pública eram feitas por meio da chamada “Conta B”. É uma espécie de avó dos cartões, que o petismo quer agora virar do avesso na CPI. Em 2001, torrou-se pela conta “Conta B” R$ R$ 213,6 milhões. A auditoria do TCU cobre um naco insignificante desse valor. Só em 2002, último ano da era FHC, o governo começou lançar mão do cartão de crédito. Financiaram, naquele ano, despesas de R$ 3,6 milhões. O grosso dos gastos “emergenciais” continuou escoando pela “Conta B”: R$ 229,5 milhões.

Sob Lula, cartões e “Conta B” ainda coexistem. Compõem um bolo de recursos que o governo chama de “suprimento de fundos”. A gestão petista gasta menos do que a administração tucana –média anual R$ 143,5 milhões de 2003 para cá. Mas o governo tomou gosto pelos cartões. No primeiro ano de Lula, os “suprimentos” somaram R$ 145,1 milhões. Desse total, R$ 8,7 milhões referiam-se a despesas feitas com cartões. Em 2007, os “suprimentos” alçaram à casa dos R$ 177,5 milhões, dos quais R$ 78 milhões deixaram as arcas do Tesouro por meio dos cartões de crédito.

Enviadas ao Planalto sete meses antes do término do mandato de FHC, as “recomendações” do TCU foram de pouca serventia. Já em 2003, ano em que os extratos dos cartões de crédito ainda não haviam sido levados ao portal da transparência, o então ministro Luiz Gushiken (Secretaria de Comunicação) repetiria uma das práticas nocivas identificadas pelo auditores no relatório sobre a gestão FHC.
Chamava-se Maria da Penha Pires a servidora que manuseava o cartão de crédito posto à disposição de Gushiken. Pagava, por exemplo, despesas com "viagens a serviço". E Gushiken trabalhava muito em São Paulo. Dava duro até nos finais de semana. Hospedou-se "a serviço" no Caesar Park de 15 a 17 de agosto de 2003 (sexta a domingo). Ficou no mesmo hotel de 22 a 25 de agosto (sexta a segunda).
Entre 19 e 21 de setembro (sexta a domingo), preferiu acomodar-se "a serviço" no Hotel Cadoro. Afora as diárias, consumiu seis águas, três guaranás, um café, um chá, um suco de frutas, um almoço completo e um beirute de filé mignon (R$ 584). Como se vê, Gushiken foi uma espécie de abre-alas da era da "tapioca".










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